Nos últimos tempos, tenho lido muito. Textos científicos, livros sobre espiritualidade, e refletido. Trafeguei, pelos meus estudos, do religioso ao técnico-científico. E tentei sintetizar, para meu próprio aprendizado, e talvez a mais alguém que possa interessar tal conclusão, o que aprendi, até agora, em minha vida, sobre o que realmente importa nesta experiência humana. Há um momento na vida no qual nos perguntamos: - Qual o sentido da vida? Esta questão inaugura um precioso instante. O de se perguntar sobre o propósito da vida. Para o psiquiatra C. G. Jung, um dos desenvolvedores da Psicologia, criador da Psicologia Analítica, que considera a questão da Espiritualidade como fundamental para o sentido da existência humana, o propósito da vida está em expandir-se. Expandir a consciência de si. Neste processo de expansão de si mesmo, descobrir-se-ia, cada vez mais, a amorosidade. Nós nos veríamos cercados de desamor e deveríamos aprender, mesmo assim, a optar pela amorosidade. Dessa forma, não estaríamos mais sendo apenas reativos. Agiríamos com autoconsciência e nos destacaríamos, descolaríamos, distanciaríamos daquele fundo desamoroso, optando pela bondade mesmo cercados da maldade. Perceber a importância de fazer. Fazer o bem. Ação amorosa – sim, amor implica ação – seria o resultado de ter compreendido o que realmente é importante na vida. Este aprendizado seria o que tornaria alguém espiritualizado. A pessoa teria aprendido a sacralizar, ou seja, tornar importante, o que realmente é importante. A saber, o Amor. O amor é mais importante que a própria vida. Basta ver um pai, uma mãe, dispostos a sacrificar sua vida em favor do filho.
A espiritualidade tem um momento para acontecer. O momento da maturidade ética. Não é um tempo cronológico, não é um tempo de juventude ou velhice. É o tempo do aprendizado Ético, quando cai a ficha de que devemos cuidar da vida em todas as suas formas de expressão, existência. O tempo de tornar-se também um cuidador. Cuidador da Criação. Cuidador também de Si mesmo. Neste tempo, abandona-se a infância afetiva, dedicada ao próprio umbigo, e já se teria feito a descoberta do Outro. Depois, dos outros. Já se teria experimentado o Tempo do Encontro, no qual se descobriria a empatia, a compaixão, e por vivências para além de si mesmo, ter-se-ia percebido o quanto somos também coletivos.
Nossa existência transcende o corpo pessoal. Assim, descobriríamos este novo tempo: além do eu, existe o outro, os outros, o cosmos. Esta ampliação da interpretação da existência seria a Transcendência, que tornaria possível descobrir que existimos para além de nosso corpo pessoal. A espiritualidade é o caminho que permite descobrir isso, trafegando por todos estes passos ou degraus. Portanto, não é um ponto de destino, mas, muito mais, como se caminha. No entanto, hoje, a Alma do mundo parece estar doente. A humanidade precisa resgatar a sensibilidade do ser amoroso, a delicadeza, a suavidade, a criação, cocriação, ao invés da destruição. Podemos dizer: resgatar a ética? Então espiritualidade, amor e ética estão interligados. Construir a espiritualidade individual também é resgatar o Mistério. Permitir perguntar-se. O que eu sou, o que é a vida, para que posso existir, como posso melhorar, para quê melhorar, e a grande pergunta cabalista, qual o sentido da vida... Na presença destas questões, diante do Mistério, surge o símbolo.
O inconsciente produz símbolos, que ajudam a exprimir as grandes questões. Uma pessoa racional demais, que não abre em sua vida espaço para o mundo simbólico, poderá ter problemas. “A ausência do símbolo sobrecarrega a esfera do instinto” (C.G. Jung). O inconsciente transforma todas as nossas experiências em símbolos, para que possam ser assimiladas por ele. Até a música que você escuta, transforma-se numa imagem. E essas imagens do inconsciente ajudam a aproximar-se de si mesmo. Estes símbolos chegam até a consciência por sonhos, pela arte, pela intuição, pela imaginação... Eles ajudam a apontar o que falta e também permitem elaborar o que nos faz sofrer. Significa que - tanto a falta quanto o sofrimento – lembre-se, aqui, de todos os lutos pelos quais você já passou, e inclua qualquer perda afetiva que você ainda venha a ter em toda a sua vida restante - fazem parte da busca pelo Sentido e também nos ensinam o que é importante, portanto estão dentro do âmbito das vivências que nos inspiram a espiritualidade. Se a falta e o sofrimento nos ajudam a aproximar da espiritualidade, por outro lado, o amor e a presença amorosa são a luz sobre todas as questões. A vivência da amorosidade como evento luminoso, ou numinoso, é a própria espiritualidade em si. Ao chegar na vivência do amor pleno, já não se precisa mais de metáforas ou outros aprendizados. Atingiu-se o estado de comunhão com toda a Criação. Atingiu-se o estado Ético, na qual toda a Vida se abraça.
Portanto, aqui podemos inferir que a espiritualidade é o caminho para a vivência do Amor pleno. Não é o destino. É o caminho. O homem, não sei se lhe é garantido chegar a tal porto seguro: mas é dado que possa caminhar. Se o Amor exige ação, ações amorosas, as boas ações, nesta jornada, são sementes espalhadas pela senda, ensinando o Amor Incondicional, para aqueles que não retrocederam pelos próprios passos para colher as flores. Pelo contrário, semearam sem querer colher. Então a espiritualidade é um caminho para que possamos semear, com o intuito de aprendermos a não querer colher. É para quem vem, na mesma trilha, depois de nós. Conseguir abrir mão da flor, em função do próprio destino é o momento da Espiritual Idade. Torço para que ela chegue a cada pessoa desta Terra. Sem ter nada, teríamos tudo e teríamos dado tudo. A grande lição. “Amar o próximo, porque ele é como tu”. Se o Amor é luz na escuridão, tornar-se espiritualizado é aceitar ser luz nas trevas. É ir até a escuridão, fazendo sua parte na cocriação, iluminando o que ainda estava escuro. Assim, coparticipamos do trabalho do Criador que, quer exista ou não uma figura criadora única, com nossa Grande Obra, fazemos com que a energia de criação exista, pela soma de nossas forças criativas. E a Imago Dei surge, independente da personificação d’Ele.
Se considerarmos Fé aquilo que lhe tira, todos os dias da cama, que faz você trabalhar pelas coisas que acredita, você se move por esperar algo positivo da vida. Por isso, o contrário da Fé é quando você não espera mais nada da vida. Você “des-espera”. O contrário da Fé é a desesperança, que lhe rouba a vontade de continuar lutando, rouba o Sentido. Já buscar a espiritualidade, pode ser comparado a buscar a experiência de iluminar o caminho ao nosso redor. Lá onde estamos. Antes de tal tarefa, é preciso olhar para a própria sombra, para a própria escuridão. Não a ignorar. O caminho começa pela própria escuridão, que jamais se dissipa de todo. Aceitar que somos luz e sombra é aceitar o dualismo inato na condição humana. Só assim pode-se vencer a escravidão impingida pela própria sombra. Conhecendo-a, agora pode-se aceitar a escuridão do outro e tentar iluminar ambas. Sem esquecer que o importante não é ser perfeito, mas iluminar. A ação amorosa é o mais importante. É esta a mensagem de grandes gurus da humanidade, em todos os tempos. Por isso, a mensagem mais sagrada de todas. Amar, em movimento, na direção do outro e da Totalidade. Que estejamos dispostos a este grande aprendizado, esta grande experiência. Chamamos de Vida. Que seja florida. Que assim seja.
Joel Elói Franz é psicólogo, pós-graduado em morte e luto; e pós-graduando em arteterapia e em psicologia junguiana.
Comments